marlon-reis-uolCoautor da lei da Ficha Limpa e da tese jurídica segundo a qual réus não podem integrar a linha sucessória da Presidência da República –a mesma discutida nesta terça-feira (7) pelo plenário do STF (Supremo Tribunal Federal)–, o ex-juiz Márlon Reis lamentou a decisão da Corte em manter Renan Calheiros (PMDB-AL) no comando do Senado, ainda que fora da linha sucessória do posto mais alto do poder Executivo.

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Reis deixou o Judiciário este ano para ser advogado da Rede, partido que pediu o afastamento de Renan do cargo de presidente.

“Interpretado adequadamente, o artigo 86 da Constituição Federal impede que, em caso de afastamento ocasional ou definitivo de quem ocupa da Presidência, ela poderia ser exercida por alguém contra quem pairam circunstâncias impeditivas. O presidente da República não pode ser réu –e, a meu ver, não se pode separar a pessoa do senador”, avaliou. “A prerrogativa de integrar a linha de substituição não é do senador que ocupa o Senado, mas da Presidência do Senado; se for aberta uma exceção, o Senado perde essa prerrogativa e é retirado da linha de substituição [da Presidência]  –o que é muito sério”, definiu Reis.

Para o ex-magistrado, a mensagem que a decisão de Renan em não cumprir a ordem liminar dessa segunda (6) pelo afastamento temporário do cargo –o que acabou referendado hoje pela Corte–, para o cidadão, foi a de “descrédito e profundo desrespeito pelas instituições democráticas”.

“E é também uma mensagem perigosa que esse tipo de situação transmite, porque transmite uma ideia para os brasileiros de que quem deveria dar o exemplo não o faz; a postura que se adotou de resistir à liminar foi, em todos os aspectos, lamentável. Não vi ninguém apontar um único argumento jurídico que justificasse que a decisão monocrática [do ministro Marco Aurélio Melo, que assinou a liminar pelo afastamento do peemedebista] tivesse alguma ilegalidade”, definiu Reis. “A postura correta seria a de se cumprir a decisão e recorrer dela. Assim funciona uma democracia.”

“Solução razoável”, avalia professor da FGV

Professor na FGV (Fundação Getúlio Vargas), o cientista político Cláudio Couto acredita que a solução apresentada pelo STF ao caso Renan é uma “solução de compromisso”: “De uma certa maneira, isso resolve a chefia sucessória, e, ao mesmo tempo, evita a interferência de um poder no outro. Não é uma solução ruim, mas uma solução razoável”, opinou.

Couto defende que a votação de hoje teve origem “em uma sucessão de erros” –entre os quais, destacou, o simples fato de um presidente de Casa legislativa responder a tantos processos judiciais. “Isso reflete o sistema político, que está repleto de gente enrolada coma Justiça da mesma forma que Renan”, destacou.

Por outro lado, o analista observou que a decisão monocrática em um caso com esse não foi a mais adequada. “Um afastamento desse porte é uma decisão muito grave para um juiz tomar isoladamente, mesmo que ele o tenha feito consultando seus pares. Pela dimensão institucional, não me pareceu a forma adequada”.

Couto não acredita que esse tipo de situação envolvendo os dois poderes tenha efeito tão óbvio já para as eleições de 2018. “Não dá para saber ainda. Se as eleições fossem semana que vem, ok, mas daqui dois anos ainda é preciso aguardar e ver o que se pode se avaliar disso tudo”, defendeu.

Professor da UnB: “crise institucional”

Professor de ciência política da UnB (Universidade de Brasília) especialista em estudos sobre a corrupção, Ricardo Wahrendorf Caldas avaliou que, independentemente do resultado no STF, a resistência do Senado em ter cumprido a liminar antes de o plenário da Corte se pronunciar “geram, sim, uma crise institucional”.

“É o que acontece quando uma elite política ultrapassada, –com métodos ultrapassados, como é o caso do presidente do Senado–, entra em conflito direto com o poder Judiciário, que é quem dá a última palavra sobre a aplicação das leis no país”, opinou Caldas. “Interesses pessoais geram uma crise institucional, e a consequência disso é o desgaste das instituições e a perda de credibilidade no sistema político.”

Na avaliação do cientista político, no caso das instituições –seja Câmara, Senado ou STF, por exemplo–, “a crise agora não é mais sobre o funcionamento ou não delas, mas de legitimidade”.

“As pessoas param de acreditar na própria existência de instituições imparciais, uma vez que elas estão voltadas não mais ao interesse público, e uma consequência dessa descrença é que elas podem acabar optando por soluções radicais que já estão se colocando como alternativas no meio político. Isso explicaria, por exemplo, o alto percentual de brasileiros que hoje defendem a volta do regime militar”, citou.

 

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